OBSERVAREDESCREVER
VERAPESSOA
"A beleza é uma tirania de curta duração."
Sócrates
"Lutar com palavras
é a luta mais vã."
Carlos Drummond de Andrade
Assim, aqui estou!
Confesso: elas e eles, amalgamados e a dominaram-me, estão em mim desde todo o sempre, porque criatura e escrava eu sou! Pequenina menina, elas e eles já me fascinavam por inteira.
Ainda com falha dentária, brincava com esses poderosos por meio de terceiros, até que me coloquei de pé resolvida a andar ainda cambaleante pelos caminhos que me ordenavam a pisar. Mas nunca, nem na idade adulta, soube deles tirar os proveitos imagináveis e impossíveis - mesmo os desejando -, por causa da eterna ingenuidade do meu ser e do tropeçar. Percebo que muitos não entendem essa ingenuidade, mas Deus bem a conhece, protege-me e me ordena a seguir.
Assim, não atendi por inteiro aos apelos dos meus companheiros invisíveis também pelos meus medos - ainda os tenho e então choro calada, diante de todas as suas profundidades, suas cores, suas intensidades, seus ritmos, suas alturas, seus feitos inesperados e deslumbrantes -, e pelos diversificados amores que gratuitamente dão a mim e os dão à humanidade.
Ao escrever estas linhas fica claro, para mim, que essas personagens sempre me puxaram e me empurram em suas direções por meio de minha incessante busca à minha criança que chora na estrada de minha vida, pois, mesmo ainda nada sendo, mas sendo, quero voltar a encontrá-la.
Minhas palavras em versos, que dizem serem poéticas, sempre foram e assim serão: ingênuas, amorosas, saudosas, solitárias, esperançosas, emocionais, infantis. Elas foram sendo possíveis de materializarem-se em grafias por meio da Palavra, de observações, de percepções e de sentimentos desenvolvidos por meio da etologia, da psicologia, da razão e das linguagens artísticas. O pensamento poético - denominado pensamento verbal - forma-se em torno de palavras, das relações entre elas e seus comprometimentos com o emocional e com o racional interno e externo ao próprio ser, assumindo, dessa forma, sua literalidade no discurso poético escrito.
Essa passagem de uma operação mental que é também fortemente emocional constitui-se o grande mistério que evidencia o resultado gráfico de uma obra de arte que poderá ou não se perpetuar. Não se constituindo, claro, nenhum mistério a evidência de que o resultado está contido nas possibilidades do sistema linguístico e da dimensão emocional e da cognitiva conscientes!
A Palavra, a natureza, a pessoa humana e as palavras são obras de arte. Há uma luta travada entre elas e o ser que as quer retratar, sendo elas sempre as vencedoras. A obra de arte é o puro lugar do humano, porque este pode, mesmo diante de sua pequenez, acolher o infinito no limite do Ilimitado: na vida, na morte, na escrita, no nada.
Por meio desses gigantes que me dominam sem serem dominados, a criação para mim toma vigor máximo no movimento e no repouso. Curando-me no silêncio, na permanência e na atenção focada. E no meu estar na perseverança (ainda que com dores) e na tentativa da escuta à Voz e obediência ao Infinito Ilimitado - o Deus do impossível, perante o qual tudo se muda, se transfigura.
Assim, aqui estou!
Vera Pessoa
São Paulo, 16.III.2014.
“Beauty is a short-lived tyranny.”
Socrates
“Fighting words
is the most idle fight.”
Carlos Drummond de Andrade
So, here I am!
I confess: they, lumped together and dominating me, are in me forever, because creature and slave I am! Little girl, they already entirely fascinated me.
Still with dental failure, I played with this power through third parties, until I stood up and decided to walk, still tottering along the paths that people ordered me to walk.
However, not even in adulthood, I knew how to take imaginable and impossible advantage of them - even wishing them - because of the eternal naivety of my being and my stumbling. I notice that many people do not understand this ingenuity, but God knows it well, protects me and orders me to follow it.
So, I didn’t respond to the appeals of my invisible companions also due to my fears – I still have them and I silently cry, before all their depth, their color, their intensity, their rhythm, their height, their unexpected and stunning accomplishments -, and due to the diversified loves that they freely give me and give to mankind.
While I am writing these lines, it becomes clear to me that these characters have always pulled and pushed me in their direction through my relentless pursuit to my child that cries on the road of my life, because, even being nothing, but already being, I want to go back and find her.
My words in verses, which some people say are poetic, have always been and so will be: naive, loving, wistful, lonely, hopeful, emotional, childish. They became possible to materialize in handwriting through the word, observations, perceptions and feelings developed through ethology, psychology, reason and artistic languages.
The poetic thinking - called verbal thinking – is formed around words, the relationship between them and their commitment to the emotional and the internal and external rational of the own being, assuming, therefore, its literality in the written poetic speech.
This passage of a mental operation that is also strongly emotional constitutes the great mystery which shows the graphic result of a work of art that may or may not be perpetuated. Not constituting a mystery, of course, the evidence that the result is contained in the possibilities of the linguistic system and the emotional dimension and cognitive consciousness!
The Word, the nature, the human person and the words are works of art. There is a struggle among them and the being that wants to portray them, and they are always the winners. The work of art is the pure place of the human, because he/she may, even before its smallness, host the infinite in the Unlimited boundary: life, death, writing, nothing.
Through these giants that dominate me without being dominated, creation, for me, takes maximum force on the movement and recumbency.
Healing me in silence, in the permanence and focused attention. And in my perseverance (albeit with pain) and attempt to listen to the Voice and obedience to the Unlimited Infinity - God of impossible, before whom everything changes, it is transformed. So, here I am!
Vera Pessoa
São Paulo, 16.III.2014.
Louvai ao Senhor! Louvai a Deus no seu santuário; louvai-o no firmamento do seu poder!
Alleluia laudate Deum in sancto eius laudate eum in fortitudine potentiae eius
Instigaram-me a observar a importância do exercício das distinções e cisões:
exercícios incansáveis de separações à busca da clareza e claridade.
Ana Maria de Almeida Carvalho
Ana Teresa de Abreu Ramos
O que seria das minhas noites sem os dias e vice-versa?
In memoriam aos meus pais
José Motta Pessoa e Maria Abbadia Pessoa